A***









A***
por Casimiro de Abreu



Poema publicado em As Primaveras



29218A***Casimiro de Abreu





Falo a ti - doce virgem dos meus sonhos,

Visão dourada dum cismar tão puro,

Que sorrias por noites de vigília

Entre as rosas gentis do meu futuro.


Tu m'inspiraste, oh musa do silêncio,

Mimosa flor da lânguida saudade!

Por ti correu meu estro ardente e louco

Nos verdores febris da mocidade


Tu vinhas pelas horas das tristezas

Sobre o meu ombro debruçar-te a medo,

A dizer-me baixinho mil cantigas,

Como vozes sutis dalgum segredo!


Por ti eu me embarquei, cantando e rindo,

- Marinheiro de amor - no batel curvo,

Rasgando afouto em hinos d'esperança

As ondas verde-azuis dum mar que é turvo.


Por ti corri sedento atrás da glória;

Por ti queimei-me cedo em seus fulgores;

Queria de harmonia encher-te a vida,

Palmas na fronte - no regaço flores!


Tu, que foste a vestal dos sonhos d'ouro,

O anjo-tutelar dos meus anelos,

Estende sobre mim as asas brancas.

Desenrola os anéis dos teus cabelos!


Muito gelo, meu Deus, crestou-me as galas!

Muito vento do sul varreu-me as flores!

Ai de mim - se o relento de teus risos

Não molhasse o jardim dos meus amores!


Não t'esqueças de mim! Eu tenho o peito

De santas ilusões, de crenças cheio!

- Guarda os cantos do louco sertanejo

No leito virginal que tens no seio.


Podes ler o meu livro: - adoro a infância,

Deixo a esmola na enxerga do mendigo,

Creio em Deus, amo a pátria, e em noites lindas

Minh'alma - aberta em flor - sonha contigo.


Se entre as rosas das minhas - Primaveras -

Houver rosas gentis, de espinhos nuas;

Se o futuro atirar-me algumas palmas

As palmas do cantor - são todas tuas!


Agosto 20 - 1859.



C.







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